sexta-feira, 6 de abril de 2018

LULA NA PRISÃO: À ESPERA DO ESPETÁCULO NA TV

Vou reproduzir trechos do texto da Márcia Tiburi, a revista Cult, onde retrata bem o poder da mídia brasileira e o momento que vivemos na nossa sociedade.

Por Marcia Tiburi, na Revista Cult:

Sabemos que o maior de todos os poderes em nossa época é o do que chamamos de mídia. Legislativo, executivo e judiciário são poderes menores perto do poder dos meios de comunicação. O conteúdo produzido pela televisão, por exemplo, funciona como uma prótese de pensamento para o cidadão alienado, mas também para magistrados, procuradores e outros atores políticos, que se demitem do dever de refletir para julgar...

...Sabemos que a influência da mídia é imensa em nosso país, mas a própria questão dessa influência já ultrapassou todos os limites dos jogos de poder que conhecemos até aqui. Hoje, podemos dizer que a mídia não apenas influencia, mas “decide” pelos outros poderes. A própria espetacularização das versões produzidas pela mídia são repetidas em atos espetacularizados pelos agentes dos poderes menores que também querem aparecer e ser elogiados na televisão e nos jornais.


Vimos o que aconteceu nesta semana. Um general usou a rede social do Twitter para mandar recados à população. Certamente ele não estava apenas trocando ideias com amigos em público. O tom do que ele disse era ambíguo, podia ser interpretado de vários modos.... Naquela mesma noite, no Jornal Nacional, o apresentador, um dos personagens mais mecânicos da cena brasileira, falava como um robô a partir do tuíte do general. Quem tem algum sentimento cívico ou visão democrática sentiu uma profunda vergonha alheia.

Há uma continuidade visível entre essa pequena cena midiática de terça-feira, 3 de abril, e a cena de ontem, dia 4 de abril, no STF, em que os ministros que votavam contra a constituição faziam um discurso populista e, muitas vezes, incompreensível. Ninguém conseguia entender o que dizia um Fachin, que chegou a citar doutrinadores que imediatamente vieram a público declarar que o ministro não havia entendido o que eles escreveram, ou uma Rosa Weber, que dizia ceder a uma maioria, que só era maioria por causa do voto dela. Discursavam mal escondendo, atrás de palavras confusas e argumentos sem pé nem cabeça, a finalidade político-midiática dos seus votos.

Um detalhe: o melhor jeito de acabar com o poder dos poderosos é não lhes dar poder. Assim, se não acabamos com o poder da televisão no dia em que nos negarmos a ser sua audiência, pelo menos somos capazes de relativizá-lo e colocá-lo assim no seu devido lugar, um lugar que deveria ser menor do que dos demais poderes. É claro que o Estado já deveria ter se ocupado de regulamentar os meios de comunicação – como fizeram a França, a Inglaterra e até os Estados Unidos -, mas os detentores do poder econômico que tomaram o Estado brasileiro sempre se beneficiaram destes meios...

...Falar de dignidade em uma hora como essa pode parecer ingenuidade. Quem vai esperar respeito à dignidade por parte de agentes que estão presos ao poder midiático? Mas há resistência, como ontem demonstraram alguns poucos ministros.

Sabemos desde o Golpe de 2016, que depôs Dilma Rousseff, para o qual ingenuamente não estávamos preparados, que há um jogo armado programado. Toda a “programação” do Golpe foi bem montada. Programaticamente montada como um espetáculo. Como em uma série de televisão, o roteiro está dado. Cada ator tem o seu papel. Direitos e garantias fundamentais devem ser afastados para não impedir o final desejado pelos diretores e patrocinadores do show. Há muitos capítulos que já vimos e todos esperam pelo capítulo final em que Lula será preso.

Um final adequado para uma audiência sádica, que sente prazer com o sofrimento e com a humilhação. Uma perversão que uma manifestante antes do julgamento deixou explícita ao declarar que seria “sexy” pedir a prisão do ex-presidente Lula da Silva.

Lula preso será um espetáculo de prazer visual para aqueles que o odeiam, e será um momento de desprazer para aqueles que o respeitam. Sem esse espetáculo, o papel exercido pelo juiz Sérgio Moro perderia o sentido e ele seria relegado à insignificância a que estava antes de ser escalado como um dos protagonistas da trama.

Com o espetáculo, esses atores canastrões conseguem uma sobrevida pelo menos com aquela parte da população alimentada com a ração envenenada do ódio produzido há tempos pela mídia.




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