Tem jovem que chegou ao Programa Integração pela Música (PIM) de Vassouras e pediu: “Quero aprender violão e tecrado.” Hoje estuda harpa e se interessa por oboé. Alguns garotos da Orquestra de Cordas da Grota do Surucucu, em Niterói, já foram revistados pela polícia dentro dos ônibus para ver se naquelas caixas estavam armas, em vez de inofensivos violinos — um pequeno contratempo diante dos prêmios colecionados pelo projeto. Antes de integrar a ONG Orquestrando a Vida, de Campos, um menino de 11 anos era tão problemático que seu irmão dizia: “Ele não vai passar dos 15 anos.” Largou o mundo das drogas e hoje, com 24, é um ótimo trompista, já tendo se apresentado no Carnegie Hall, em Nova York.
O amigo e bancário Paulo de Tarso ajuda com seu trabalho voluntário a Orquestra de Cordas da Grota do Surucucu. Dois gêmeos de 11 anos — órfãos que perderam o pai aos 2 meses e viram a mãe se prostituir em busca de trocados para comprar crack — superaram os problemas de comportamento após entrar no projeto Estrada Musical e tocar violino na Orquestra Maré do Amanhã, no Complexo da Maré. No primeiro dia do projeto Ação Social pela Música do Brasil no Morro dos Macacos, na Tijuca, há um mês, 108 alunos da favela se inscreveram — 30 deles com 6 anos. Dois percussionistas da Orquestra de Barra Mansa foram convidados para tocar dia 21 com a Orchestra Del Maggio Musicale Fiorentino, regidos por ninguém menos que Zubin Mehta.
A música clássica está mudando o destino de milhares de jovens carentes país afora. O fenômeno chamou a atenção de Heloísa Fischer, que edita a revista “VivaMúsica!”. O anuário deste ano traz um dossiê especial do fenômeno que ela batizou de Cidadania Sinfônica. Heloísa mapeou 92 projetos de “integração social por meio da prática orquestral” no Brasil.
— Nos últimos anos, o crescimento tem sido em progressão geométrica — diz Heloísa. — O Brasil está em sintonia com uma tendência internacional. A base é o programa El Sistema, da Venezuela, idealizado pelo regente José Antonio Abreu. Mas, diz ela.
— Aqui são iniciativas individuais pulverizadas, a cargo de ONGs ou órgãos de cultura.
Essa origem no El Sistema talvez explique um dado: o Estado do Rio, com 19 projetos de cidadania sinfônica, lidera o ranking nacional. E o Rio é a cidade campeã, com 12 — embora os dois maiores projetos, Guri e Instituto Baccarelli (Sinfônica Heliópolis), sejam paulistanos.
— O sistema da Venezuela é muito associado aos barrios, bolsões de pobreza, realidade muito parecida com a nossa — diz Heloísa.
Fonte: O Globo e www.viniciusassumpcao.com.br
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