quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

POR QUE NELSON MOTTA ODEIA OS SINDICALISTAS


Nelson Motta é muita coisa na vida: jornalista, compositor, escritor, roteirista, produtor musical e letrista. Sempre esteve bem na e com a mídia, gosta de se cercar de celebridades e parece possuir bom gosto musical. Não me sinto apto a avaliar sua obra e seu trabalho vinculado à Música Popular Brasileira. Mas quando ele entra na seara do movimento sindical, sinto-me à vontade para debater e rebater, respeitando sempre o direito de quem quer que seja de expressar sua opinião sobre qualquer assunto. Em seu artigo "Os bons companheiros", publicado no jornal O Globo no último dia 2 de janeiro, Motta generaliza ao insinuar que todo sindicalista é "esperto" (no sentido mais pejorativo da palavra), "oportunista" e "não possui aptidão" e nem "talento profissional". Quem generaliza comete sempre uma injustiça. Assim como no jornalismo, na literatura, nas artes e na música há talentosos e medíocres, na política e no movimento sindical não é diferente.
Motta foi injusto com os sindicalistas e, em seu exemplo citado, com os bancários. Ele condena ao estigma da mediocridade todo o trabalhador que passa a atuar no movimento sindical. Em sua avaliação insípida, ele acredita que qualquer pessoa que transcende a lógica mercadológica do capitalismo (que propaga o egoísmo, o individualismo e a competição desenfreada) e luta por sua categoria através da solidariedade e da busca do bem-estar coletivo perde ou nunca teve talento.
De fato, atuar no movimento sindical tem um alto preço pessoal e pode custar todo um futuro profissional, mas não por falta de dedicação, interesse ou competência do trabalhador que torna-se sindicalista. Na prática, os patrões nunca perdoam o funcionário que passa a ter consciência de classe e luta coletivamente pelos direitos de sua categoria. Os sindicalistas, quando retornam à empresa, são perseguidos e tratados como se representassem uma ameaça aos interesses econômicos da empresa e, na primeira oportunidade, acabam sendo demitidos. É óbvio que sem a estabilidade, o empregador demitiria no primeiro dia os empregados sindicalistas. Um a um, estes trabalhadores do movimento sindical seriam demitidos e não haveria mais sindicatos. Este é o sonho neoliberal dos capitalistas e, ao que parece, do Nelson Motta. É compreensível. Afinal, Motta sempre precisou do patrocínio dos bancos para seus shows, produções e festas.
Ao contrário do que ele diz, são os banqueiros que parecem odiar os bancários e pouco se importar com a sociedade, o Brasil e o mundo. Afinal, a crise financeira que levou a derrocada o país e o modelo de sociedade idolatrado por Motta, os EUA, é fruto da ganância e da ciranda especulativa promovida por banqueiros e empresários que não têm limites para acumular riqueza, mesmo que o custo social para isso seja a demissão de milhares de trabalhadores, pessoas sem teto e mais miséria e desigualdade no planeta. Até dezembr o do ano passado, pelo menos meio milhão de pessoas perdeu o emprego em função da jogatina capitalista.
Quanto à política em seu sentido clássico, é natural que um sindicalista tenha o direito de se candidatar a um cargo público ou receba um convite para trabalhar num ministério, secretaria ou estatal. O Malan ocupou o Ministério da Fazenda e ao sair do governo ganhou um cargo num grande banco. Henrique Meirelles foi executivo de um banco estrangeiro e hoje é diretor do Banco Central. Não concordo com ambas as indicações políticas para o governo. Mas, da mesma forma poderia acontecer com um jornalista, um pedreiro, um metalúrgico, um trabalhador sindicalista de ser convidado ou eleito para um cargo público. É, antes de tudo, um direito constitucional.
Tamanha aversão e preconceito contra os sindicalistas tem outra explicação: tucano roxo, Nelson Motta (assim como seus colegas do programa Manhattan Conection) não engole a eleição de um operá rio e sindicalista para presidente do Brasil e o fato de Lula ter o reconhecimento internacional e o apoio popular que seu amigo, o sociólogo Fernando Henrique Cardoso, ambicionou mas não conseguiu conquistar.
Esta inquietação e incômodo com a presença de trabalhadores e sindicalistas no poder lembram uma das justificativas dos militares para o golpe de 1964: a de que o Brasil estaria construindo uma "República Sindical". Ao citar a ditadura militar, não posso deixar de lembrar de tantos companheiros e companheiras do movimento sindical, que, na luta em defesa da democracia, foram presos, torturados, exilados e assassinados. Um desses sindicalistas, o bancário Aloisio Palhano, torturado e assassinado pelo Doi-Codi e cujo corpo jamais foi encontrado, é uma dessas personalidades cuja memória tratamos sempre de resgatar para a nossa categoria. O Sindicato dos Bancários do Rio foi invadido e tomado pelas forças armadas. Passamos vinte anos lutando pela redemocr atização do país, assim como continuamos a lutar por uma sociedade mais justa. Acredito que essas vidas dedicadas à democracia e a causa social têm muito mais relevância do que as que buscam apenas seu sucesso pessoal e adoram tornar-se celebridades da mídia.
Quanto à atuação política de Nelson Motta durante a ditadura militar eu me desculpo por desconhecer completamente. Do período, lembro-me apenas de sua imagem nos anos 70 e 80 como repórter da TV Globo para divulgar agenda cultural e falar de MPB. Os proprietários da emissora receberam benesses da ditadura para apoiar o regime em troca de apoio através do noticiário parcial e governista e de uma agenda cultural alienante.
Além do mais, o jornalista deveria lembrar de seus colegas de categoria que trilharam ou trilham o movimento sindical. Afinal, as férias remuneradas, o décimo terceiro salário, a jornada de trabalho e todos os direitos trabalhistas garantidos em sua carteira de trabalho só foram possíveis graças à mobilização dos trabalhadores junto aos sindicatos, entidades que Nelson Motta parece tanto odiar. Talvez porque ele nunca dependesse de seu salário para sobreviver e sustentar a si e a sua família.
Vinicius Assumpção - Presidente do Sindicato dos Bancários do Rio de Janeiro

Um comentário:

  1. Parabéns pelo artigo Vinícius, muito bom. Roberto Chaves Banco do Brasil

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