Por Carlos Vasconcellos*
Maravilhosa a festa das torcidas de Fluminense e Vasco no domingo passado. Tricolor, torci com alegria, mas também com melancolia, ao saber que essa festa popular está ameaçada. O novo projeto do Maracanã para a Copa 2014 vai encolher ainda mais o espaço para os torcedores. Por trás do discurso de modernização e do álibi da necessidade de oferecer mais conforto aos torcedores há um processo de elitização dos estádios brasileiros.
A obra que extingue as cadeiras azuis, chamada carinhosamente de geral vip, atende as exigência da Fifa para uma Copa do Mundo em que o povão não será convidado para assistir nos estádios. À massa, restará assistir os jogos em casa, pela TV, aturando o monopólio de exclusividade da Globo e o chato do Galvão Bueno.
O torcedor paga cada vez mais caro para torcer por seu clube nas arquibancadas e enfrenta sempre novas dificuldades para ir aos estádios nos grandes jogos.
Como se não bastasse a europeização dentro de campo, através da supremacia do futebol força, de marcação e obediência tática em detrimento da habilidade singular do futebol brasileiro, tentam agora impor ao torcedor uma cultura alienígena na forma de torcer, fria e comportada, com lugares marcados e limitações até na hora de empurrar o time de coração. Querem domesticar o futebol como fizeram com o carnaval, transformando-o num evento para inglês ver. Eis o sonho dos ricos e dos que fazem do esporte um rentável negócio: aumentar o preço dos ingressos, diminuir a capacidade dos estádios, transformando-os em ambientes nobres, com restaurantes caros e shoppings sofisticados, para inibir, constranger e afastar o povão de sua maior paixão popular.
Após as obras, o estádio será reduzido para uma capacidade de pouco mais de 70 mil pessoas. Tirando os "convites" e "caronas" e os camarotes, restarão pouco mais de 40 mil ingressos para torcedores de Flamengo, Vasco, Fluminense e Botafogo "disputarem a tapa" um ingresso nos grandes clássicos. Tudo para afastar os pobres de um de seus programas preferidos e ainda contribuir com a farra das emissoras de TV à cabo e Pay Per Viw.
A presença de pobres e negros nos espaços públicos sempre incomodou as elites. Na praia, nas praças, nos eventos, nas festas da cidade e, é claro, no Maracanã. Dizia Nelson Rodrigues que as elites tinham pavor de ver o Maraca tomado por quase 200 mil pessoas, a maioria vindo das Zona Oeste e Norte e da Baixada Fluminense, os bairros mais populares do Rio. Segundo o genial escritor e cronista esportivo a burguesia tremia só de imaginar uma improvável rebelião daquela gente toda. "Já imaginaram se eles se unem e se revoltam"?
Além de elitista, o projeto do Maraca pós-moderno é resultado de uma obscura concorrência. Porque o governo do estado não fez um concurso através de votação popular para a escolha do melhor projeto, entre os apresentados e aprovados pela FIFA? Quais foram os critérios de escolha e quem optou pelo projeto vencedor, um atentado contra quem venera o outrora, maior e mais popular estádio do mundo?
Aos poucos, conseguem nos afastar até de nossa maior paixão, o futebol. Só falta mesmo é o governo do estado privatizar o memorável estádio.
O Maraca não é mais nosso.
* Carlos Vasconcellos é editor do Jornal BancáRio